Início Notícias O gesso agrícola: produto estratégico e pouco valorizado

O gesso agrícola: produto estratégico e pouco valorizado

311

 

Foto: Blog do Roberto

Por Geraldo Eugênio / Jornal O Sertão*

A saga da moderna agricultura brasileira é recente. Foram nos últimos cinquenta anos que o país deixou de ser um comprador de alimentos para transformar-se no terceiro mais importante ator no comércio internacional de commodities agrícolas. A principal razão dessa mudança radical foi aprender como se manejava o solo do cerrado brasileiro. Esta área central do país se caracteriza por um clima propício do ponto de vista de precipitação, chovendo uma média de 1.500 milímetros entre os meses de outubro e maio, topografia plana ou levemente ondulada, solos com boa textura e mecanizáveis facilmente. A principal limitação foi identificada em sua constituição química ao dispor de quantidades elevadas do cátion alumínio, que o acidificava e, além do mais, ‘agarrava-se’ ao fósforo, tornando-o indisponível para as plantas.

Verificou-se também que quem resolvia a questão era a aplicação de calcário, uma rocha formada predominantemente por Carbonato de Cálcio (CaCO3) que tem várias aplicações, mas que do ponto de vista agrícola, corrige o solo, elevando seu pH através da reação com o hidrogênio, tornando o alumínio menos disponível. Esta reação maravilhosa, devido à baixa solubilidade do calcário, ocorre apenas na lâmina de solo em que o calcário é aplicado, isto é, ao redor de vinte a vinte e cinco centímetros.

Neste jogo, entra a ação do gesso natural, proveniente da rocha gipsita, quimicamente conhecido como Sulfato de Cálcio desidratado (CaSO₄·2H₂O). Amplamente presente na região sertaneja do Araripe. O uso mais comum do gesso é na construção civil. Neste caso, a rocha deve ser calcinada, submetida a temperaturas elevadas para expulsar as moléculas de água nela contidas. Outra função de grande relevância para a agricultura brasileira é a aplicação nos solos ácidos, associada ao uso do calcário. Por ser mais solúvel do que o calcário, o gesso se desloca no perfil do solo com maior facilidade, carregando íons como o alumínio e expondo um perfil de solo bem mais profundo ao desenvolvimento do sistema radicular das plantas. O que implica na otimização do uso da água e dos nutrientes.

Uma característica de natureza nobre do gesso do Araripe é seu caráter natural. Ele é fruto direto da moagem da gipsita e não um coproduto da indústria de adubos fosfatados. Portanto, um material sem contaminantes ou riscos ambientais, além de alta eficiência na reação com o solo, medida através de um parâmetro conhecido como CTC – Capacidade de troca catiônica. Provavelmente o gesso de maior pureza usado na agricultura brasileira.

Sem gesso, não se produz.

O fato é que, sem o gesso e o calcário, o Brasil não teria a agricultura pujante que nele se desenvolveu. No caso específico do gesso agrícola, milhares de relatos e experimentos registram ganhos entre quinze e vinte e cinco por cento de elevação de produtividade em culturas como milho, sorgo, café, pastagens e ao redor de quinze por cento em se tratando da soja. Sua ação representa um incremento de produtividade que faz a diferença entre uma produção lucrativa ou não. Entretanto, pasmem, o gesso é o insumo menos valorizado na maioria das cadeias produtivas da agricultura brasileira.

Atualmente, uma tonelada de gesso agrícola natural é vendida no Araripe por algo ao redor de sessenta reais a tonelada, enquanto uma saca de cinquenta quilos de qualquer mistura de adubo custa em uma loja um valor ao redor de cento e setenta reais. Logo, é importante chamar a atenção para o fato de que o gesso agrícola é o único insumo que Pernambuco fornece em escala ao agronegócio nacional.

Há um outro fator estratégico no processamento e comercialização do gesso para uso agrícola. A gipsita não necessita ser calcinada, o que resolve de modo direto a demanda de calor para esta etapa, uma energia suprida em sua totalidade pelo consumo de lenha.

Por que seu valor é tão baixo?

Em se tratando de um produto tão importante para a agricultura nacional, por que o gesso é o insumo menos valorizado entre todos os componentes de qualquer cultura? São vários os fatores, a exemplo de: 1. Uma representação empresarial que ainda não se conscientizou da valorização de seu produto; 2. A venda da rocha semiprocessada ou do pó de gesso sem nenhuma agregação de valor; 3. A ausência de uma estratégia comercial de valorização do produto que o insira no mercado de fertilizantes e micronutrientes; 4. Um desconhecimento marcante do setor gesseiro sobre o que representa a agricultura para a economia nacional; 5. Ausência de um esforço em pesquisa, desenvolvimento e inovação que promova de modo mais intenso o uso do gesso na agricultura, incluindo a Chapada do Araripe.

Ainda há o que ser feito.

O que pode ser feito para valorizar este insumo deve ter sido discutido em alguns fóruns ao longo dos anos, entretanto se destacam algumas iniciativas que podem ser levadas em consideração, conforme se segue: 1. Sistematização do valor do gesso de modo que nhoque deixe de ser comercializado pelo mercado ‘spot’; 2. O engajamento das indústrias de gesso com as escolas de nível médio e superior visando a capacitação de jovens profissionais com melhor conhecimento sobre o uso agrícola ou industrial; 3. A necessidade de um programa de pesquisa envolvendo a Embrapa, escolas de agronomia, instituições de pesquisa e extensão no desenvolvimento de novos produtos e aplicações; 4. Um trabalho político que eleja como prioritária a conclusão da Ferrovia Transnordestina entre Salgueiro, PE, e Eliseu Martins, PI, o que representa definitivamente a ligação entre a área da mineração e o cliente final.

*Professor titular da UFRPE-UAST.

DEIXE UMA RESPOSTA

Please enter your comment!
Please enter your name here