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Justiça sem juízo: Soltura de traficante confesso despreza inteligência policial e mina combate ao crime

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Foto: reprodução

Editorial Estadão

A mão suave de um magistrado desferiu um duríssimo golpe no combate ao crime organizado no Brasil, em particular ao tráfico de drogas. Como se isso não bastasse, ainda conspurcou a imagem de todo o Poder Judiciário perante uma sociedade angustiada pela incapacidade do Estado de ao menos atenuar a sensação de insegurança.

No dia 4 passado, o juiz Luciano Silva, da 2.ª Vara Federal de Araçatuba (SP), inocentou o piloto Wesley Evangelista Lopes, preso em flagrante no final de 2024 por transportar nada menos do que 435 quilos de cocaína em um avião de pequeno porte. Malgrado ter confessado o crime, pelo qual teria recebido R$ 100 mil, segundo relato do próprio aos policiais que o prenderam, Wesley foi solto e agora pode voltar a cruzar os céus livremente.

Para o juiz, não havia “fundadas suspeitas” que justificassem a abordagem dos policiais à aeronave. Logo, para o sr. Luciano Silva, todas as provas contra o piloto colhidas a partir da intervenção policial no local são nulas. “O sentimento, ao ler e reler os autos, é de livro começado pelo meio”, escreveu o magistrado na sentença absolutória. “Se inicia com a aeronave do réu sendo abordada de maneira espetaculosa pela Polícia Militar (PM), sem que exista motivo claro para a mobilização de diversas forças na captura do mencionado avião.”

Para qualquer cidadão minimamente sensato, resta evidente que o aparato policial paulista não foi mobilizado por acaso para se dirigir ao local de pouso da aeronave. Havia a informação de que Wesley Lopes transportava drogas ilícitas. E essa informação veio da Polícia Federal (PF). Mas, para o juiz Luciano Silva, a cooperação entre as duas forças policiais não tem valor legal porque, pasme o leitor, a origem da informação repassada pela PF “é ignorada”.

Com uma só canetada, o juiz federal não apenas obliterou um bem-sucedido trabalho de integração das polícias nas esferas federal e estadual – algo que deve ser valorizado num país tão violento como o nosso, e não desprezado –, como ainda aniquilou a ação de inteligência da PF, que sabia exatamente que o avião carregava drogas, o que foi confirmado, e informou o fato à autoridade competente em solo. Mas nada disso valeu, a despeito de o juiz federal reconhecer que “não há dúvida do caráter criminoso das atividades perpetradas pelo réu, que merece reprimenda”. Beira o escárnio.

Por óbvio, não se defende aqui o atropelo de garantias legais. O devido processo legal é um pilar do Estado Democrático de Direito. Mas a filigrana não pode servir de substrato para decisões que afrontam a razão e o interesse público. A Justiça, para ser digna do nome, não pode estar alienada da realidade. Quando um juiz reconhece o crime, admite a culpa, mas solta o criminoso porque a origem da informação policial não é conhecida, o que se vê não é justiça, é um desatino. O que está em jogo é muito sério: a confiança dos cidadãos na capacidade das instituições de prover justiça, proteger a sociedade e enfrentar o crime com firmeza e responsabilidade.

Ao desqualificar uma ação coordenada entre as polícias com base num formalismo extremo, o magistrado mostra que o bom combate ao crime exige mais do que leis, exige juízo.

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