
Folha de S. Paulo
Lula apostou e está perdendo. Ainda antes de assumir seu terceiro mandato, o petista decidiu que fugiria ao script normal dos governantes, de iniciar a administração apertando o cinto para concentrar os gastos nos anos finais, e obteve do Congresso a PEC da Transição, que lhe deu R$ 145 bilhões para começar a gestão já tinindo. Por seus cálculos, se largasse bem, conseguiria estender a avaliação positiva até 2026 e assegurar a reeleição.
Não está dando muito certo. A administração até tem bons números a apresentar em termos de crescimento, renda e emprego, mas eles foram obtidos de modo insustentável. A receita de turbinar a economia com gastos públicos não é uma que possa ser adotada em bases permanentes. É justamente por isso que governantes costumam repartir seus mandatos em anos de contenção seguidos de anos de expansão dos investimentos.
O problema de Lula é não apenas que os bons indicadores macroeconômicos não se converteram em popularidade como também que a administração vai acumulando desgastes naturais. O governo petista não criou o escândalo do INSS, mas o ampliou e se mostrou negligente em seu enfrentamento. Pelo menos parte disso vai para a conta de Lula.
E fica pior. Em termos eleitorais, já é tarde para mudar de estratégia. Lula não tem muita alternativa que não redobrar a aposta nos gastos. E isso coloca a equipe econômica numa situação quase impossível.
Impedido por ordem superior de promover cortes de despesas, o ministro Fernando Haddad se vê compelido a procurar novas receitas e criar ilusionismos contábeis para tentar manter em pé o frágil arcabouço fiscal, sem o qual a gestão da dívida pública piora de vez, com impactos inflacionários e eleitorais.
É um contexto que predispõe a Fazenda a barbeiragens, como vimos na elevação do IOF. Não é algo que tire muitos votos de Lula, mas pode ser o que falta para tirar definitivamente da órbita do petista o grupo de liberais comprometidos com a democracia que se mostrou decisivo para derrotar Bolsonaro.