Início Notícias Só países em guerra têm déficit tão alto quanto o Brasil

Só países em guerra têm déficit tão alto quanto o Brasil

80
Rombo das estatais nos oito primeiros meses de 2024 foi o maior para o período em 22 anos, segundo dados do BC. (Foto: Ilustração/Gazeta do Povo com DALL-E)

Um dos principais nomes do mercado financeiro brasileiro já não enxerga grandes riscos com a transição no Banco Central. Para Luis Stuhlberger, CEO da Verde Asset e gestor do Fundo Verde, não há um cenário “Alexandre Tombini” com a gestão de Gabriel Galípolo à frente do órgão, a partir de janeiro, no lugar de Roberto Campos Neto.

O grande problema, diz, é a política fiscal, já que o déficit nominal do governo brasileiro, que inclui as despesas com juros, está no mesmo nível de países que precisam financiar grandes conflitos: “Só Ucrânia, Rússia e Israel, países em guerra, têm déficit tão alto quanto o Brasil”, afirmou em entrevista ao Estadão.

Ao lado do novo economista-chefe do Verde, Marcos Fantinatti, em sua primeira entrevista no cargo, Stuhlberger diz que a ideia do governo de isentar o Imposto de Renda até R$ 5 mil terá um custo de R$ 70 bilhões a R$ 80 bilhões por ano, e que isso é um risco que pode ofuscar os ganhos com o pacote de cortes gastos a ser anunciado pelo governo Lula.

Mesmo se enquadrando entre os chamados “super-ricos” do País, Stuhlberger diz que a ideia em elaboração pelo Ministério da Fazenda de garantir uma tributação mínima sobre todas as fontes de renda “não é ruim”, mas pode ser difícil de ser aprovada, em função dos lobbies que atuam no Congresso. A seguir, os principais pontos da entrevista.

Qual a avaliação do sr. sobre o momento atual da economia?

Stuhlberger: O Lula imagina que a melhor forma de governar é distribuir dinheiro. Ele pensa o desenvolvimento sob a ótica do Estado. Juntando-se funcionários públicos, aposentados e benefícios sociais, dá um número que está beirando R$ 1,5 trilhão, distribuído a 110 milhões de pessoas. É sobre esse número que se discute dar um limite para o crescimento do gasto. Agora, existe essa vontade de subir a isenção de Imposto de Renda para R$ 5 mil. Por que ele quer isso? Porque da faixa de renda entre zero a R$ 3 mil, praticamente todo mundo vota no Lula. De R$ 3 mil a R$ 5 mil, ele já perde muitos votos; e de R$ 5 mil para frente, ele perde com folga. Então, são muitos votos a ganhar com a isenção. Só que isso vai custar entre R$ 70 bilhões a R$ 80 bilhões.

E esse tipo de pensamento dificulta o controle das contas públicas?

Stuhlberger: O que o Lula pensa da Faria Lima? Que as empresas têm um monte de benefícios, o que é verdade, porque há mecanismos, como as debêntures incentivadas, que não pagam impostos. Temos uma carga tributária de 34% de Imposto de Renda mais Contribuição Social. Mas, se olhar as empresas de capital aberto, elas pagam muito menos. E aí ele pensa: por que eu vou cortar dos pobres, se os ricos ganham bilhões em dividendos e não pagam impostos? Então, esse é dilema do Lula: a Faria Lima me pressiona, ameaça jogar o dólar para R$ 6 – embora não seja assim – para eu cortar dos pobres. E o que os ricos vão me dar, nada? Esse é o escopo da discussão com o ministro (da Fazenda) Fernando Haddad. E o Haddad claramente fala: se você não fizer nada, vai ficar muito pior: a inflação vai subir, o dólar vai para R$ 7 e você vai perder a eleição. Então, essa é a síntese simples, o dilema do governo.

Fantinatti: Temos uma dívida que terminou o ano passado em 74,7% do PIB e já está rodando quase em 78%. Se pensar do ponto de vista estrutural, temos um déficit de 1% do PIB, talvez 1,5%. E você joga isso sobre uma dívida alta e não consegue enxergar uma trajetória sustentável. O arcabouço (fiscal) prevê uma margem de crescimento da despesa entre 0,6% e 2,5% (ao ano acima da inflação), mas ninguém fala mais nisso. Agora, tudo virou 2,5%. Por que não faz esforço para jogar para 0,6%? Parece que prefere o teto. E, nesse cenário, a dívida vai crescer a três ou quatro pontos por ano; daqui a pouco vai para 85% e 90% (em relação ao PIB).

Vocês projetam estabilização da dívida?

Fantinatti: Não consigo enxergar; pelo menos até 2030, começo da década que vem. E esse eu acho que é o grande problema da economia, que não é fácil resolver.

Stuhlberger: Por que os juros reais do Brasil são os mais altos do mundo? Primeiro pela alta indexação: tudo corrige pelo IPCA. Em segundo lugar, porque quando o governo sobe os gastos da maneira que o PT sobe, e mais o incentivo fiscal com o parafiscal, isso faz a economia crescer acima do potencial, e a inflação aparece. O governo gastou em 2023 por conta da PEC da Transição cerca de R$ 170 bilhões – sem contar que o Bolsonaro já tinha subido um monte, porque ele que triplicou o Bolsa Família. Então, tem inflação crônica, e o Banco Central fica preso em armadilhas das quais não consegue sair – e aí entra num círculo vicioso: juros vão ter que subir para 13% ou 13,5%. E vem o gasto do governo com juros, que é o que incomoda o PT raiz. O Brasil vai fazer déficit nominal de 10%, crescendo mais do que 3% do PIB.

DEIXE UMA RESPOSTA

Please enter your comment!
Please enter your name here