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Corrupção no Brasil é inexplicável, afirma José Mujica

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O ex-presidente do vizinho Uruguai, critica corrupção no país e adverte: ela mata a esquerda.

Diário do poder

Foi guerrilheiro a metade de sua vida, passou 15 anos na prisão, viveu na montanha, na clandestinidade, e agora diz que está velho e não sabe como estará dentro de cinco anos para voltar a concorrer à presidência do Uruguai. Mas, escutando José Mujica, ninguém diria que o político está no fim de sua carreira. Enérgico, influente como poucos na região, atento a tudo e a todos, Mujica viajou a Buenos Aires para lançar o livro sobre seu período na presidência, “Uma Ovelha Negra ao Poder”, de Andrés Danza e Ernesto Tulbovitz, que ainda não foi lançado no Brasil.

Pergunta. Viaja agora para a Espanha para reencontrar suas origens bascas. Fechou o círculo?

Resposta. Sim, agora vou para Muxica, para lembrar a família do meu pai. E, depois, a uma cidadezinha da Itália, perto de Gênova, onde está a família da minha mãe. Vou porque estou entrando numa idade que, se não for agora, não vou mais.

P. Dizem que o senhor vai voltar a ser presidente do Uruguai, que continua sendo referência.

R. Continuo sendo referência, mas não sei como vou estar dentro de cinco anos! Tenho 80, pensar nos 85 é corajoso, não?

P. A política está mudando?

R. A crise da política apenas acentua o individualismo. Prefiro que as pessoas não estejam com a esquerda, mas que estejam com a política. Pagaria esse preço. A antipolítica é aventureirismo ou fascismo. Prefiro a política conservadora, mas a política.

P. Tem medo do populismo?

R. Tenho medo dos sem partido, os que não respondem a nenhuma disciplina. Os partidos são o primeiro elemento de controle que os indivíduos têm. Seja o PP, o socialismo, Podemos. Mas é algo coletivo. Mas, cuidado, se o populismo é luta para elevar o nível de vida das pessoas ou as políticas de igualdade, muitos podem cometer esse pecado. A fronteira disso é quando as medidas tomadas paralisam a economia, porque você quer dividir tanto, que no final rompe o interesse no trabalho e no investimento. Se você matar isso, não tem para dividir. Eu chamaria isso de populismo.

P. Está falando da Venezuela?

R. A Venezuela tem a desgraça do petróleo. O país mais roubado da América Latina. Como pode andar uma sociedade em que uma garrafa de água custa mais do que um litro de gasolina?

P. As pessoas protestam e se distanciam da política no Brasil, no Chile, por causa da corrupção. As novas gerações são mais exigentes?

R. Temos um flagelo interior de caráter ético. Quando o afã de fazer dinheiro se mete dentro da política, isso mata a nós da esquerda. Por que a corrupção prolifera tanto? Parece sensato que pessoas de 60, 70 anos se sujem com pesos imundos? Sabem que têm pouca vida pela frente! A questão de ter dinheiro para ser alguém pode ser uma ferramenta de progresso no mundo do comércio, onde há riscos empresariais, mas, quando se insere na política, estamos fritos. Isso aconteceu na Itália, em parte na Espanha. É inexplicável isso no Brasil. E aqui na Argentina o vice-presidente está sendo processado.

P. No livro diz que no Brasil parecer impossível fazer política sem ceder à corrupção.

R. A democracia moderna é muito cara. O Brasil é muito grande, tem Estados que são como países. Ali há partidos locais, e o que conquista o Governo nacional tem de negociar com eles. Aí começa tudo.

P. Vem uma época difícil para a esquerda latino-americana?

R. Não sabemos. A direita também não está dando muitas respostas, não acho que possa fazer maravilhas. Acho que estamos em um momento de retrocesso da esquerda na Europa e certo grau de estancamento na América Latina.

P. Como alguém que foi guerrilheiro vive a aproximação entre EUA e Cuba?

 R. Era um resquício da guerra fria, é preciso acabar com isso. Nos EUA muita gente acredita que isso vai levar a mudanças na sociedade cubana, e os cubanos acham que vão resistir. A história vai decidir. Os cubanos têm um ponto forte: mandam milhares de médicos para o exterior e o grau de deserção é mínimo. Poderão resistir? Não sei, porque será preciso ver o efeito da entrada em Cuba da “magia da mercadoria”, nas palavras de Trotsky.

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